terça-feira, 18 de agosto de 2015

Batom vermelho

Domingo, 8 horas da manhã, Porto Alegre. Faz frio e o tempo está nublado. Pego o primeiro ônibus que passa. A cobradora é simpática, usa um batom vermelho vibrante e tem as unhas pintadas com flores. Eu estava acordando, mal tinha engolido um café. Aquele visual colorido logo cedo me chocou.

O ônibus estava vazio, tinham umas 5 pessoas. Eu sentei no fundo, na janela. Queria dormir um pouco até chegar ao centro da cidade. Escorei minha cabeça na janela, fechei os olhos, cruzei os braços, me aconheguei no banco.

- Hoje vai ter manifestação. Coisa mais ridícula isso!, disse a cobradora.

"Porra, tia, política a essa hora?", pensei. Mas resolvi escutar. Afinal, uma das minhas grandes paixões na filosofia é a teoria política. E a dona seguiu seu discurso:

- Querem tirar a presidente pra colocar um pior. Eu não sou do PT, nem gosto do PT, mas também não sou boba, né? Eu penso as vezes. Imagina se o PSDB tivesse eleito o presidente? O Brasil todo iria estar como o nosso Estado. Quebrado, falido, parcelando salário. Coisa horrível parcelar salário. Por isso eu não sou funcionária pública. Imagina, ficar na mão de políticos pra receber teu salário, pagar tuas contas.

E assim ela seguiu seu discurso. Falou sobre política até o ônibus chegar ao centro. Desci.

Enquanto caminhava pelas ruas desertas e frias do centro, fiquei pensando naquela mulher. Em seu batom vermelho e suas palavras. Ela não me parecia ser muito letrada. Falava de maneira despojada, cheia de gírias. Não devia ter muito estudo. Poderia facilmente proferir o discurso da grande massa, insatisfeita com o governo, que absorve aquilo que assiste na tevê e reproduz sem o pensamento crítico. Mas não. Ela, ali, naquela hora, para aquelas sonolentas pessoas, deu a opinião sincera dela. Quem dera que mais pessoas fossem assim. Independente de quem vota, o que acha certo ou errado para o nosso país. Mas que mais pessoas pensassem e não só reproduzissem.

Em tempos de instabilidade e insatisfação, precisamos de mais senhoras com batons vermelhos e unhas pintadas com flores para nos fazer acordar.


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